sábado, 3 de setembro de 2011

57º ao 62º dias - Capítulo 32 - Água e Sal!




''Umas das coisas sobre morar no exterior é que , todo e qualquer tipo de momento nostalgico que voce venha a ter é elevado a uma fatorial de numero 100000.  Ou seja,  por menor que seja o momento, ele tomara proporções bem maiores.
Pode ser a lembrança do sagú que vc comia na cantina da escola na terceira serie, os momentos de confidência com aquele amigo que sabia mais sobre você do que você mesmo, a caminhada no bairro para ir comprar pão para a mâe.
Não sei por que na maior parte das vezes comigo isso se relaciona a comida, menos mal, porque é mais facil de lidar, afinal não é tão doloroso sentir saudade da raspadinha com leite condensado e groselha do tiozinho da praça da cidade, ou do cachorro quente do trailer da esquina ( aquele prensado que tinha vinagrete, batata palha, catchup, mayonese, mostarda e pure de batata, ah e salsicha calro ), ou do geladinho de 20 centavos que garantia meu 'recreio" no primário.
Mas quando o momento se refere àquele tempo em que a tia te preparava seu prato predileto, ou sua amiga ia na sua casa para ler atrevida e experimentar roupa.
Quando vc estava para baixo e sem precisar falar , sua amiga ja sabia o que fazer para te animar.
Sinto saudade até  (ou principalmente) dos momentos de silêncio que eram tão normais entre amigos, um silencio de paz.
Nada que se compara ao silêncio constrangedor que toma conta da vida adulta, aquele de cobrança, aquele com a pergunta o que vc tem.
Acho que o que eu estou sentindo faltada hoje em dia é ficar em silencio acompanhada.''  por Karen Kidd

Hoje é um daqueles dia em que eu queria ficar deitado na cama, só pensando no valor da vida, no preço que pagamos pelas nossas decisões.
Acordei diante de mais um daqueles dias cinzas de Dublin. Daqui a 2 dias comemoro meu segundo mês longe do cigarro. Uma conquista e tanto pra alguém que como eu, vivia pelo cigarro.
E sempre nestes dias melancólicos, cinzas e chuvosos que me pego absorto em meus pensamentos mais construtivos. Nostalgia, tristeza, melancolia, alegria e saudosismo se misturam de uma forma tão perfeita que criam um clima um tanto quanto ameno em meu ser.

O texto que postei no início eu peguei de uma amiga minha Karen. Ele me fez pesnar em como as coisas aqui na Europa realmente são. Muita gente pensa que quando viemos pra Europa ou qualquer outro lugar que não o nosso verdadeiro lar, acabamos por abdicar de coisas como família, amigos, amores e tudo mais pra poder ter uma vida melhor. Até certo ponto, é verdade. A vida aqui, em comparação com muita coisa no Brasil, é de longe bem melhor. Poder de compra, status de vida, poder trabalhar por alguns dias e ganhar mais do que se ganharia por 1 mês de trabalho no Brasil, poder conhecer a Europa inteira sem gastar muito com isso, enfim, muita coisa aqui é realmente melhor do que no Brasil, mas nada supre a falta de um calor humano, de uma conversa no fim de tarde na praça do bairro, de depois de um dia de trabalho encontrar um amigo pra um ''happy hour'', de tomar uma cervejinha gelada no bar da esquina, de ir almoçar na casa da mãe no domingo e por lá ficar a tarde inteira, de ouvir as primeiras palavras do sobrinho quando ele te chama de titio numa língua quase indecifrável, de sentar na varanda e conversar com os irmãos amenidades, tudo isso são coisas que não temos aqui. Aqui é tudo muito frio, muito cinza. Por sorte ainda tenho Alysson aqui comigo, se não fosse isso, eu não conseguiria sozinho!

Sinto falta de gritar pra minha mãe buscar minha toalha. Saudades de conversar com meu irmão Lennon, que apesar de todas as brigas, era o único que realmente me entendia. Somos muito diferentes, mas ao mesmo tempo somos muito iguais. Ele me entendia, me criticava, me elogiava, ríamos bastante quando estávamos juntos. Sentar na varanda e fumar um cigarro, tomar um café, implicar com minha irmã, irritar nossos sobrinhos, dividir coisas vistas na internet. Ele é hoje sem dúvida o irmão que mais me orgulho. As conquistas, as batalhas pelas quais ele passou, tudo que ele vem conquistando por conta do trabalho, é de longe um orgulho.
Saudades do meu irmão mais velho também. Apesar dos seus erros na vida, me orgulho bastante dele também. Enfim, saudades de todo lá em casa.
Dizem que saudades é uma coisa que dá e passa, mas quando é que ela passa?

Hoje o dia é daqueles saudosos mesmo. E é exatamente nestes dias em que eu me afogava na fumaça fedorenta do cigarro. Passava horas pensando na vida, pensando na morte da bezerra, com o cigarro na mão. Mas hoje não tem graça. Hoje quero pensar e escrever sobre saudades. É ao mesmo tempo um sentimento ruim tanto quanto é bom.
Queria poder tentar mudar a situação. Voltar para o Brasil? Não. Há muito o que fazer aqui, muito o que aprender e a viver por aqui junto com Alysson. Saudades eu tenho sim, mas o pior de ser adulto é não poder fazer aqui que a gente gosta, mas sim o que temos que fazer. A busca por um lugar ao sol, uma estabilidade na vida exige que a gente abdique de algumas coisa que a gente gosta, do que a gente quer, isso se chama ''Crescer'', e como diz meu amigo: ''-É chato ser adulto.''

Mas estou feliz com minha vida. Feliz com minhas escolhas. Algumas me fizeram crescer espiritualmente e como pessoa. Me sinto mais forte, mais adulto, mais confiante.

Status dia: Melancolicamente feliz!

Frase do dia: ''Eu sou uma pergunta. Sou tudo o que não tem explicação. Sou alguém em constante construção.''  Clarisse Lispector

Musica do dia:  

por Maikon Marques